A turma M2 do ALPI Master teve a oportunidade de acompanhar por videoconferência a conferência de Geraldo Luiz Dois Reis Nunes no dia 8 de outubro de 2020, situação inédita visto que já se passaram vários anos desde que ele se deslocou pessoalmente a Rennes 2 para conhecer o Master's alunos e colaborar no laboratório ERIMIT. Infelizmente, isso não foi possível este ano devido à pandemia global, Covid-19.
O Sr. Nunes é professor universitário da Universidade Federal do Rio Janeiro (UFRJ) e ex-vice-presidente da UFRJ responsável por Relações Internacionais. Por ser especializado em história brasileira, permitiu-nos compreender melhor a vida política e econômica do Brasil e as relações que mantém com o resto do mundo.
Esta videoconferência permitiu-nos mergulhar durante várias horas na história brasileira, mas também perceber o caminho que tem sido percorrido, nomeadamente no que diz respeito à escravatura, e ter uma análise do atual governo de Jair Bolsonaro. O Sr. Nunes nos explicou que os incêndios no Brasil não se devem apenas ao aquecimento global, mas também ao irritante hábito dos brasileiros de queimar a Mata Atlântica que já foi destruída em mais de 90%. Vimos também que os detentores de propriedades no Brasil hoje provêm em grande parte da capitania hereditária.
Depois disso, ele discutiu conosco a história da escravidão no Brasil. Quando esta foi abolida em 1888, os proprietários ficaram sem saber o que fazer com os seus escravos. É importante lembrar que nesta época não eram considerados pessoas, mas sim animais, peças que não tinham ligação com a cidadania. Os escravos eram parte integrante do inventário familiar para o qual trabalhavam de geração em geração. Se o escravo de uma família fosse para a guerra e ali morresse, os proprietários geralmente recebiam uma indenização, mas se ele voltasse, escapava da condição de escravo e não tinha mais a obrigação de voltar a trabalhar com seus antigos proprietários.
Quando finalmente foram libertados, houve um grande número de ex-escravos nas cidades. Boa parte deles conseguiu se beneficiar da Lei Áurea (a lei que aboliu a escravidão no Brasil) mas a população negra infelizmente permaneceu excluída da possibilidade de educação e do mercado de trabalho. Apesar da liberdade que lhes foi gradualmente dada, porque o fim da escravatura não aconteceu de um dia para o outro, alguns viram-se sem saber para onde ir ou o que fazer, razão pela qual algumas pessoas permaneceram a trabalhar com os seus proprietários. Enquanto algumas famílias permaneceram nas propriedades onde haviam sido escravas, outras migraram para os centros urbanos, em busca de um futuro melhor, de trabalho.
Hoje, os negros ainda são muitas vezes considerados como partes, como seres inferiores, daí o desejo do governo de Jair Bolsonaro de querer exterminar a população indígena, pelo menos o que resta dela. Segundo Ricardo Salles, ministro do atual governo, os indígenas ocupam espaço e não servem para nada. Explicou em particular que iriam “aproveitar a pandemia para abrir o portão e deixar passar o gado”, o que significava implicitamente que queriam acabar de uma vez por todas com a população indígena. Geraldo Nunes acrescentou que em 1970, mais de 50% da população era analfabeta, e hoje muitos eram analfabetos funcionais, e por isso não entendiam o que liam.
Hoje, 55% da população brasileira não tem água potável em casa, e na universidade um número específico de vagas é reservado para negros ou pardos. Às vezes representam apenas um décimo do total de alunos, tudo depende da universidade em questão. E se descobrir que um mestiço se declarou branco, ele automaticamente perde o lugar e é imediatamente demitido quando isso é descoberto.
Por fim, no que diz respeito à pandemia global, hoje a Covid-19 está causando numerosos e graves danos, particularmente no Brasil. Nas grandes cidades, alguns brasileiros se encontraram nas ruas e ainda hoje estão porque não têm como voltar para casa, não podem utilizar meios de transporte por falta de dinheiro ou até mesmo juntar-se à família. Alguns não têm para onde ir ou onde se refugiar...
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